terça-feira, 12 de junho de 2018

A CASA DA MINHA INFÂNCIA

São tantas as lembranças da casa onde vivi os mais belos dias da minha infância e juventude. As recordações vão aumentando à proporção em que a dor invade o meu peito e me transporta até a janela da cozinha. Dali, é como se estivesse vendo o grande espantalho no arrozal, as bananeiras, o canavial, a cacimba, onde permanecia ao redor, sentada junto ao meu avô, horas e horas, esperando a água minar...

E ele me contava muitas histórias, depois colhíamos alguns frutos e voltávamos apressados pois, já se aproximava das seis horas da tarde, momento de tocar o sino da igreja para a oração do Angelus. Sempre vivemos na simplicidade. Eu, meus avós (Dindinho Piroca e Dindinha Ermelina), Tia Bebé , Tia Zinha, Tio Tonho, Maristela, Maísa e todos que aí passaram guardam saudosas e queridas recordações desses bons tempos, quando algumas pessoas vinham da zona rural para estudar, como Glória Guirra, Dalvinha, Marinalva de São Miguel, Pedro Paulo, Lita, entre outros. Também professores, sacerdotes, policiais, parentes e amigos foram acolhidos nessa casa. Era habitual a animada presença dos netos, netas, sobrinhos e sobrinhas para ouvir as mais lindas e impressionantes histórias. Sendo o amor e a paz sempre constante no nosso lar em nossas vidas, vivenciando a união, o respeito e a solidariedade. Os bons costumes, a moral, a religião, a fé, foram preservados, vivendo em tranquilidade e segurança, muito longe de imaginar que chegaria o tempo de não se ter o direito à liberdade, expostos a tantos crimes e violência nas ruas, nas residências, em todos os lugares.
Quantas e quantas vezes, na madrugada, eu acordava com o barulho das latas das pessoas que iam pegar água bem clarinha da primeira chuva na laje. Despertava a esperar pelo momento de apreciar da janela do quarto o retrato mais belo da natureza, o nascer do sol, que ia despontando no horizonte, como uma enorme bola de fogo, no espetáculo de cores; seus raios iluminavam toda a lagoa azul. Ainda muito cedo, no clarão dos primeiros raios do sol, habitualmente estudava os assuntos que a professora passava diariamente. Depois de aprendido e decorado tudo, a Tia Bebé me tomava a lição. Ela sempre achava que o melhor horário para estudar era esse bem cedinho, ao raiar do di; assim, tudo ficaria mais fácil de aprender, tendo as lições sempre na ponta da língua. Outra coisa que se observava também, a fim de facilitar os estudos, era a de não tomar café preto, quando criança correndo o risco de “se tornar muito burra”.

Muitas vezes, era interrompida pela voz do “louro”, repetindo tudo e falava, e chamava:Maristela! Desça! O galho tá se partindo! Ah! Ah! Marinalva a a... Já acordou? Tia Zinha a a... Quero café! Dona Ermelina, o tupã tá ai?
Ora! Onde já se viu, em vez de perguntar pelo dono, pergunta é pelo cachorro? – resmungava minha avó. E o papagaio gritava mais alto: Marilu! Marilu! Ta na hora da escola! Marilúzia, assim se chamava a menina, com quem eu brincava. Morava ao lado, vive hoje em São Paulo, com sua mãe, D. Maria. Seu pai era o “veio” Ernestino, destemido e ousado caçador, conhecido pelas suas histórias de assombração e de lobisomem. Tinha a função de marchante, dedicava-se sempre ao comércio de carnes.

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