Era o ano de 1947, o jovem Didi, vivendo em plena juventude de rapaz solteiro, aos 23 anos de idade, tendo trabalhado com muita determinação e coragem, nos últimos cinco anos, dedicando-se ao comércio, juntou uma boa quantidade em dinheiro e resolveu viajar para São Paulo, sabendo notícias que lá na cidade grande, era bem mais fácil arrumar um bom emprego e conseguir uma vida melhor.
Assim, no dia 10 de fevereiro de1947, chegou em Caldeirão Grande, o caminhão Mercedes do estado da Paraíba, sendo proprietário o Sr. José Resende, (Zé Padre) que viveu e residiu à Rua da Matriz com sua família.
Esta seria a primeira viagem de pau-de-arara com destino a São Paulo e a lotação já estava completa por oito pessoas de Caldeirão Grande: Pulu, barbeiro do Jenipapo, Leôncio, Rosalvo, dois filhos de Antônio Luís, Chiquinho da Tia Tina, Didi e Josias, seu cunhado.
Os outros eram 37 nortistas da Paraíba e de Pernambuco. O motorista era também Paraibano. Ao todo, embarcaram 45 homens. Não imaginavam do drama que estava pra acontecer.
A partida então foi um verdadeiro clamor. Todos vieram assistir o triste adeus. Os amigos, conhecidos, parente, esposas, filhos, despediam-se chorando, abraçavam-se e entregavam algumas coisas pequenas, como medalhas para dar sorte, o rango para os primeiros dias de viagem, não podia faltar.
Lá se foram pela estrada Rio Bahia, que se achava em construção e muito acidentada, devido as obras, os caminhos vicinais péssimos, eram tantos os desvios, ficando perdidos, algumas vezes. Outras até, era necessário desmatar algum trecho a fim de dar passagem ao caminhão, que já enguiçava muito, ficando dias, parado no conserto, ou por falta de combustível, outras vezes, atolado. O pau- de-arara na situação que se encontrava não dava mais para rodar e não havia mais dinheiro para consertar.
Os dias se passavam e, com muito sacrifício, chegaram até Vitória da Conquista onde abandonaram o caminhão quebrado, porém, mais lamentável era a situação dos passageiros, muitos deles, já passando por privações do alimento, do remédio, o desconforto da viagem... Assim, em meio a tantas dificuldades, seguiram até Montes Claros. O dono do velho carro Mercedes, por demais cansado e desanimado, tomou a decisão de passar um telegrama para sua terra, pedindo recursos para o conserto do carro. Os passageiros, sem esperança, sem condições, não podiam mais esperar e, nessa situação penosa, tiveram que se separar na estação ferroviária de Montes Claros-MG, sem saber qual seria o destino dos companheiros de viagem da Paraíba e de Pernambuco. O sonho da viagem do pau-de-arara, termina por aí. Porém a sorte dos passageiros de Caldeirão Grande foi diferente. O Sr. Didi, que havia levado CR$ 3.500,00 (três mil e quinhentos cruzeiros), apesar dos gastos, ainda sobrava um pouco. Reuniram-se todos eles e juntaram as economias que restava de cada um para comprar as passagens de trem.
E foi assim, a troco de muita maçada de sacrifício e espera, que conseguiram as oito passagens de primeira classe até São Paulo, sendo que esperaram cinco dias na fila da estação.
Finalmente, o destino da viagem estava chegando... Após vinte e dois dias, não viam o momento de conhecer São Paulo, suas fábricas, seus edifícios, o movimento das ruas, o bonde. Como seria a terra da garoa? Pensavam assustados, já pisando as terras paulistas em três de Março de 1947.
RETIRAR-SE OU MORRER
Periodicamente as grandes estiagens devastavam toda região, comprometendo a vida das pessoas, pela miséria, doenças, a falta d’água assim, por volta de 1953, muitas famílias foram obrigadas a deixar sua terra, em busca da sobrevivência em São Paulo, na esperança de um trabalho ou ficar, arriscando a sorte, vendo tudo se perder, assistindo o feio drama da morte das pessoas, dos animais, pela trágica moléstia da fome
A partir daí, o movimento dos paus-de-arara aumentaram, espantosamente, deixando lugares em extrema desolação, levando homens, mulheres de todas as idades, crianças, para um mundo desconhecido.
Enquanto isso surgiu as primeiras frentes de trabalho denominadas CAN (Campanha de Alimentação do Nordeste) que na verdade, não passava dos conhecidos “tapa buracos”, um programa do governo, que visava amenizar a fome, pagando pelas horas de trabalho.
Em Caldeirão Grande, as primeiras frentes, trazidas pelo deputado Edgar Pereira, inicialmente consistia na escavação de tanques, aguadas, que na ocasião, a lagoa existente junto à laje, que se compunha de várias cacimbas e tanques menores, com o trabalho de remoção das terras, transformou-se numa grande lagoa, para maior acúmulo das águas das chuvas.
No inicio, com pagamento pelo árduo trabalho, as pessoas recebiam apenas, um pedaço de carne seca (jabá), feijão e rapadura.
Muitas outras “frentes de trabalho” aconteceram em épocas de estiagem, com trabalhos de roçar as estradas, ou abrindo caminhos vicinais, fazendo outras aguadas. Consta que esses trabalhadores recebiam o pagamento com uma insignificante quantia em dinheiro e alguns alimentos básicos, como feijão, o arroz, a farinha, o óleo e o milho, sendo os mesmos da pior qualidade, por exemplo, o feijão preto e o arroz, não havia fogo que os cozinhasse de tão duros.
Assim, foram dadas as informações.
DESTINO DOS RETIRANTES
Evidentemente que a história do"pau-de-arara", repetiu-se milhares e milhares de vezes, em todo o nordeste brasileiro.
Quantos companheiros, amigos, parentes, abraçaram-se pela última vez nunca mais se encontraram, nem souberam ao menos da sorte do outro. Caldeirão Grande, a exemplo, considerando o número de pessoas que partiram, poucas tiveram o privilégio de voltar a sua terra, poucas também são aquelas, que vêm a título de passeio, matar as saudades... O fato é que a maioria sofre pelo desejo de regressar sem nunca conseguir. Assim vai passando dez, vinte, trinta, cinquenta anos, sem rever pai, mãe, irmãos, parentes que se perderam no tempo e na distância, morrendo também com eles, o seu maior sonho, o de abraçar a sua gente.
É necessário ressaltar o exemplo de considerável número de pessoas que se projetaram em São Paulo e diferentes lugares adquirindo condições favoráveis de existência com o trabalho, uma profissão e criatividade. Através do estudo prepararam-se e educaram seus filhos, propiciando ainda a saída de muitos, com a oferta de um emprego e a esperança de uma vida melhor.
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